terça-feira, 31 de julho de 2012

Desabafos De Um Profeta




É difícil a vida de profeta, do homem que "empresta" o ouvido a Deus e
a boca ao povo. 
Ele ouve de Deus o que deve dizer, e diz. É desprezado e apreciado; 
incompreendido e aceito; colocado na  cova para morrer e liberto, xingado e
elogiado. É louco e sábio; homem de alegria e de tristeza. De paz e de guerra.
É o profeta. 

O profeta ouve o que os demais não ouvem. Vê o que ninguém enxerga. 

Ele nunca poderia ser um pastor presidente porque seu ministério está
acima do líder convencional; vive nas esferas celestiais e enfrenta as
dificuldades financeiras da terra. Se  é profeta, não poderia ser presidente de
igreja...ele tem que ser presidente mas não goza das delícias e do conforto
do poder. Muitas vezes o profeta se viu diante da possibilidade de liderar, de
mandar, de executar, mas seu ministério é mais alto, mais transcendental. 

Ele foi chamado para ser o porta-voz de Deus e na maioria das vezes o
cargo de presidente não se enquadra com seu ministério. Ele vive bem acima
de um presidente de igreja, mas profundamente abaixo no que diz respeito às
demais coisas da vida. 

Alimenta-se de gafanhotos, não de caviar, mas tem o privilégio de comer
o pão dos anjos. Seu automóvel nunca  é o melhor, mas costuma fazer
passeios nas carruagens de fogo. 

Deus pede que o profeta, muitas vezes,  se afaste da congregação local,
da denominação, da liderança ministerial, única forma de Deus tratar com a
igreja. É como se Deus estivesse dizendo ao profeta: "Sua presença profética,
intercessora, compassiva; sua renúncia, suas várias milhas de caminhada de
paciência; a força de amizade que você tem diante de mim, me impede de
tratar com a congregação. Não consigo tratar com os líderes com você no meio
deles; não consigo tratar com a igreja, com você amando e sentindo compaixão
por ela; preciso que você caia fora...deixe-me agir". 

O profeta ensina a congregação, e sofre desiludido com a falta de
resposta. Ele quer ver os dons abundantes, santidade, honestidade, fidelidade,
zelo, no entanto.... 

O profeta se vê obrigado por Deus a abandonar a liderança, para que
Deus trate diretamente com os líderes. Se vê obrigado a renunciar à vida
congregacional, para que Deus trate com os sentimentos da Igreja. 

O profeta conclama à oração. A liderança vê nisto uma boa coisa para a
igreja; ela, no entanto, da oração não participa. O profeta suspira por um
avivamento, mas desiludido vê que o pouco de avivamento que existe é usado
para o engrandecimento do homem e da instituição que dirige. Ele vê o todo
enquanto os demais vêem em parte. Ele enxerga longe, os demais perto. 
  
O profeta sofre. Ele vê os querubins e serafins e o trono majestoso de
Deus mas Deus não lhe permite usufruir da glória da visão; Deus o remete ao
mundo do pecado para que ele exclame: "Ai de mim, pecador". A glória de
Deus, ao invés de ofuscar e eliminar o pecado, destaca sua iniquidade e a
iniquidade do povo. A mesma glória que ele vê no céu, ilumina com seu brilho o
pecado destacando-o fortemente aos seus  olhos. E ele sofre com isto. Foi
assim com Moisés que viu através de uma fenda da rocha a eternidade; foi
assim com Isaías e com Paulo que nem podiam descrever o que haviam visto!
O profeta de Deus sofre com os demais profetas! 

Ele fala a palavra de Deus e o que escreve é rejeitado pelos líderes e
queimado na lareira da vida.  Ele adverte os líderes, mas se vê obrigado a
deixá-los a mercê de seus pecados. Aquele texto bíblico poderia ser escrito
assim: "E nunca mais viu o profeta aquele líder, até o dia de sua morte". Mas
ele insiste, ele intercede, ele ama e ouve de Deus que não deve mais
interceder por aquela pessoa...seu amigo.  

Nas madrugadas silenciosas ele procura o ombro de Deus e da esposa e, descobre
extasiado que Deus e a esposa estão à procura de seu ombro para desabafar. Ou então
Deus desabafa: "Quanto ao João...como amo o João. Quanto mais bato nele,
mais amor sinto; quanto mais penso em consumi-lo, mais se comove por ele o
meu coração".

Ele intercede, clama e o desabafo de Deus é: "Não interceda mais por
ele; porque eu o rejeitei". "Não interceda mais por esta cidade; porque eu quero
destruí-la". Mas ele insiste. Ele vê a congregação no caminho errado; ele vê o
líder vivendo na abundância de sua liderança, e clama por misericórdia. Mas
ouve Deus dizer-lhe: "Chega! Não fale mais neste assunto comigo". 

O profeta tem que renunciar a tudo. Os demais podem ter. Ele não. Sua
vida deve corresponder em tudo com a mensagem que prega. Para aqueles é
lícito; para ele, não! Deus o "aperta" de todos os lados. Se Deus trata com a
igreja, primeiro trata com ele. Se Deus trata com a cidade, primeiro com ele.
Ele sente fome antes mesmo da fome vir; ele sente dores; antes mesmo dela
chegar. 

O profeta encarna em seu ministério a essência do caráter de Deus. Se
Deus se ira, ele também; mas não pode extravasá-la. Ele apenas geme. Como
Jeremias, geme. "Ah!   Meu coração! As paredes de meu coração!" (Jr 4.19). A
ira que Deus sente por esta ou aquela situação consome seu interior.
Literalmente ele sente dores em seu coração; quase desfalece. Parece que
tem um enfarto. O único que tem direito ao desabafo é Deus. Deus precisa
desabafar e encontra no seu companheiro,  o profeta, o amigo com o qual
desabafa! E o amigo de Deus tem que ficar quieto, sofrer as dores de Deus! 

E Deus desabafa mesmo! Mas o profeta, este intercessor amigo de
Deus, dialoga com ele, convence-o  de que não pode destruir, que tem de
preservar, que o seu povo merece um pouco mais de compaixão... O profeta
segura aqui embaixo a ira que vem lá de cima. E geme. E como geme! 
  
Mas ele também encarna a alegria  de Deus! Não uma alegria que se
extravase publicamente; é uma alegria que ambos partilham em seus
momentos a sós. Deus jubila, ele também. Deus vibra, o profeta também.
Vibram juntos. Como dois companheiros alegres que caminham dando risadas,
eles também. Ninguém os entende. Mas eles riem. São amigos. E que amigos!  

O profeta é o ombro no qual Deus encontra amizade e compreensão. É
o ombro no qual Deus desabafa. Deus encontra consolo no ombro do seu
amigo, profeta. Com quem desabafar senão com aquele que conhece o seu
coração? 

Deus suspira o profeta também.  O coração de ambos parece ter a
mesma pulsação. As lágrimas que derrama são a materialização das lágrimas
de Deus; sua inquietude também. Quanto  sente gozo é porque Deus sente
também. O profeta é como se Deus estivesse
materializado...falando...avisando...alertando. 

O profeta vê o que o líder da igreja não discerne. Ele vê o futuro, a
glória, a noiva adornada, o noivo chegando... o líder muitas vezes tem seus
olhos noutras coisas, lícitas, espirituais, mas não no que o profeta vê! 

E o que ele escreve, poucos entendem. A índole profética não lhe
permite associar-se com o que pensam os grandes grupos denominacionais. O
que escreve, raramente pode ser publicado. Soa irreverente. Não está de
acordo com a editora confessional; nem com a editora secular. O que ele
escreve não é publicado nem por uma nem por outra. Os extremos vividos pelo
profeta cutucam o mundo com seus pecados e mexem com a igreja e suas
"doutrinas" ou ideologias. 

Sofre profeta, sofre! É por isso que às vezes num ímpeto de fuga você
quer desabafar, ir para bem longe; queimar as "pontes" os "elos" com seus
antigos “amigos”. Tanto faz um navio pronto a naufragar ou um deserto
escaldante a lhe consumir. Ele não se importa. Ele quer mesmo é morrer! Mas
seu amigo que o chamou ou que o enviou não desiste! Ele o quer perto dele,
como a dizer: "Não vê que estou sofrendo por aquela  gente? Não me
abandone. Sofra comigo". E lá vai o profeta uma vez mais renunciar a tudo o
que quer e a tudo o que sente! 
Como eu gostaria que vocês, principalmente os novos nessa caminhada enxergassem como o profeta e não como as “raposas amigas”!!

Deus e profeta! Que dupla amiga!  

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